A cada crise de mania ou
depressão
vivenciada pelo paciente bipolar, importantes partes do
cérebro
são danificadas. Repetidas ocorrências podem levar a danos muitas vezes irreversíveis.
“O transtorno bipolar é uma doença tóxica, ou seja, são
liberadas toxinas que atuam na destruição dos neurônios, levando a perda
de capacidade mental”, explica Angela Miranda Scippa, psiquiatra e
presidente da Associação Brasileira de Transtorno Bipolar (ABTB).
Leia mais sobre o transtorno bipolar na Enciclopédia da Saúde
A crise pode mexer como o equilíbrio do organismo, aumentando o estresse oxidativo em todo o corpo e agravar a doença em si.
“Cada episódio faz com que a doença piore um pouco”,
alerta Flavio Kapczinski, psiquiatra e pesquisador da Universidade
federal do Rio grande do Sul (UFRGS).
“A cada cinco quadros depressivos, há uma perda de 10 a
20% no hipocampo”, quantifica Fabio Gomes, psiquiatra e professor da
Universidade Federal do Ceará. O hipocampo é uma estrutura localizada no
lobo temporal do cérebro, responsável principalmente pela memória e
pela cognição. Nesses casos, por exemplo, os resultados são a falta de
concentração e dificuldade na leitura.
“Muitas mudanças reversíveis podem gerar uma grande mudança irreversível”, diz Kapczinski.
Os danos no cérebro podem ser maiores ou menores,
dependendo da intensidade e duração dos sintomas e da crise em si. “É
como ter um corte no braço. Se você agir logo, pode reduzir as chances
de infecção e deixar uma cicatriz menor. Cada episódio de mania ou
depressão deixa uma espécie de cicatriz”, relata Angela.
Cada crise gera também um desgaste no corpo. Diversos
estudos já demonstraram que a mortalidade entre os pacientes não
tratados é maior do que aqueles em tratamento.
“Os bipolares não tratados morrem em média 20 anos antes da população em geral”, alerta Kapczinski.
Além do alto índice de suicídio – estimativas da ABTB
apontam que até 50% dos portadores da doença tentam o suicídio pelo
menos uma vez na vida e 15% realmente se suicidam – há também uma
incidência maior de comorbidades como doenças cardiovasculares e câncer,
o que aponta para um deterioração progressiva e consequente agravamento
do quadro, que pode até levar à morte.
“O bipolar pode ficar dois anos apresentando sequelas de
uma crise ou, em alguns casos, nunca se recuperar. Sem tratamento, as
crises vão piorando e as sequelas se acumulando”, completa Antonio
Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria
(ABP). Por isso, o diagnóstico e o tratamento precoce dessa doença
crônica são tão importantes.
Você saberia agir diante de um surto psicótico?
Veja algumas dicas
Atualmente, os pacientes levam em média 10 anos para
serem diagnosticados com transtorno bipolar. O desconhecimento e o
preconceito e sobre esse transtorno do humor são os principais motivos
que levam à demora. Na tentativa de reverter o quadro, a Associação
Brasileira de Psiquiatria lançou esta semana, em Natal (RN), durante o
Congresso Brasileiro de Psiquiatria, uma campanha nacional de alerta
sobre a doença, que atualmente afeta 2,2% da população brasileira.
“As pessoas não se tratam porque não sabem o que tem, não
entendem a doença, não conhecem seu prognóstico. É possível identificar
os primeiros sinais e saber que assim que eles aparecem deve-se ir ao
médico para evitar uma crise”, diz Antonio Geraldo.
Leia mais:
Os extremos opostos do transtorno bipolar
Os principais sintomas do transtorno bipolar são
irritação e agitação, depressão, insônia, sentimento de êxtase, fala
rápida, distração, alegria exagerada, excitação sexual exacerbada, perda
do apetite e pensamentos suicidas.
“Mas não são alterações comuns de humor, como a que
estamos acostumados a vivenciar. O comportamento muda, a pessoa age
diferente do que costuma ser e os sintomas se apresentam durante sete
dias, em média. Parentes, companheiros e amigos são os primeiros a
notar”, esclarece Angela.
A doença normalmente se manifesta pela primeira vez na adolescência, mas a pessoa pode apresentar os sintomas em qualquer idade.
“O ritmo biológico desregulado, a privação do sono, ou um
evento estressante podem desencadear uma crise. A instabilidade que se
instala não é exclusivamente de humor, mas também de funções biológicas
como pensamento, metabolismo e ritmo. O humor é somente a que mais
aparece”, explica Teng Chei Tung, psiquiatra do Hospital das Clínicas,
em São Paulo.
Existem dois tipos mais comuns de transtorno bipolar: o 1
e 2. O primeiro é caracterizado por quadros de euforia e mania
intensas, ideias de grandeza, inquietação e comportamento suicida. O
segundo apresenta quadro mais leve na intensidade com mania leve,
costuma ser falante, tem problemas para dormir e costuma ser agitado.
“Esse é o que passa mais despercebido na sociedade e o mais difícil de ser diagnosticado”, afirma Angela.
Leia também, no Delas:
Grávidas e bipolares
O tratamento mais adequado para a doença inclui
psicoterapia, medicamentos para regular o humor e psicoeducação
(conscientizar o bipolar e a família sobre o transtorno e ajudá-los a
identificar as crises e agir).
Os médicos são unânimes em afirmar que os remédios não
criam dependência química e ressaltam que eles são necessários e
indispensáveis. O tratamento deve ser seguido para toda a vida.
“O objetivo é não só controlar as crises, mas evitar que elas apareçam”, ressalta Antonio Geraldo.
Leia mais notícias de saúde